PAULO CALDAS / BRASIL, 2011 / 90 MIN.
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Não parece haver muito do Paulo Caldas de Deserto Feliz no Paulo Caldas de País do Desejo. Ainda que uma certa
fragmentação narrativa permaneça, bem como um refino técnico notável, neste
segundo filme o que mais se sobressai é a ausência de uma força reconhecível e
uma entrega a pontas soltas desnecessárias. Num único filme, assuntos demais,
sérios demais, tendem a dizer coisas de menos. É o pecado da pretensão.
Maria Padilha é uma pianista com uma doença terminal nos
rins. Exibe um ceticismo diante da vida e acha que a música que carregava
dentro de si morreu antes dela. Fábio Assunção é um padre progressista, que não
se opõe irracionalmente ao aborto e incentiva o uso da camisinha. Ela é filho
de pai ateu, tem um irmão médico e a mãe em estado de coma há muito tempo.
Na construção dos personagens principais (o padre e a
pianista) e no encontro entre ambos através do acaso, Caldas preenche seu filme
com sugestões de subtramas que não se completam e parecem servir como um
tempero que nunca provamos.
Há o médico e sua esposa que pretendem ir à Bulgária porque
as mulheres búlgaras são lindas e fica-se por isso mesmo. A esta promessa de
permissividade erótica é acrescentada a nova enfermeira da mãe em coma. Uma jovem
japonesa que lê mangás eróticos e exala uma tentação inocente nas roupas que
veste.
Tão solto quanto estas subtramas está o caso da menina de 12
anos violentada pelo tio e grávida de gêmeos. Inspirado num caso real que
ocupou a mídia alguns anos atrás, a história da excomunhão da menina, da mãe e
dos médicos que realizaram o aborto é o pretexto para um dos conflitos do
filme. Mas tudo com tão pouca conexão entre si que o artificialismo acaba sendo
o único fator relevante da história. Contribui para isso as atuações fracas, os
diálogos artificiais e a tônica teatral de algumas cenas.
É a não conexão dos blocos, com suas elipses e sugestões incompletas,
que desfigura esta trama. Sem em Deserto Feliz
as elipses funcionavam como mosaico da tragédia e da salvação, embora nunca
feliz de fato, aqui elas apenas desagregam as pontas soltas que poderiam formar
uma linha uniforme e até coerente.
Desconstrutivo de si mesmo, Pais do Desejo acena com intenções demais e narrativa de menos. Quer
falar de amor incondicional, intransigência religiosa, soberba clerical, verve
erótica e relações familiares, mas brinca de ser livre e nessa brincadeira
perde o fio da meada.
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