SELTON MELLO / BRASIL, 2011 / 90 MIN.
--
Lírico, delicado, melancólico, esperançoso. Estes são alguns
dos adjetivos empregados para se falar de O
Palhaço, segundo filme dirigido pelo ator Selton Mello. Os adjetivos estão
corretos; é difícil falar dessa obra sem repeti-los.
Benjamim (Selton Mello) desenvolve uma obsessão por
ventiladores. Como que descontextualizada e ao mesmo tempo simbólica, essa
obsessão atravessa o filme para significar o achado, a conquista de algo tão
simples como um ventilador. Não se engane com esta ilusória simplicidade. Aqui,
o eletrodoméstico marca uma redescoberta íntima em Benjamim, que passa todo o
filme perdido diante da dúvida sobre sua vocação e futuro.
Se no picadeiro Benjamim é o palhaço Pangaré, fora dele é
melancolia sempre. Apresenta-se com seu pai, o palhaço Puro Sangue (Paulo
José), dono do circo Esperança. Forma, com outros artistas, uma trupe que
percorre as pequenas cidades do interior com seu espetáculo, muitas vezes tão
pobre e precário quanto as pessoas que o vão aplaudir.
Benjamim vive uma crise interna. Faz rir, mas não encontra
quem o faça rir. Ele é o palhaço triste; arquétipo que emana de seu íntimo, não
de sua maquiagem. Transita quase sem entusiasmo pelos problemas recorrentes dos
outros artistas, que absorve como seus, aprofundando sua insatisfação
melancólica com a vida mambembe.
Mello cria um registro lírico em um filme de estrada, como
bem manda a cartilha dos filmes de circo. Mas não se entrega a clichês fellinianos
ou a sentimentalismos baratos, de sentimentos fáceis. Seu protagonista carrega
na tristeza a mesma complexidade e a mesma simplicidade do humano. Ele tem
dúvida, amargura-se com ela e vai em busca das respostas.
Não por acaso Benjamim precisa tirar sua identidade,
documento que o registra no mundo com rosto, ao contrário da certidão, que
apena diz que ele é nascido. Junto com o ventilador, é uma identidade que ele
busca. A descoberta de quem ele é, em todos os sentidos.
Enquanto segue pela busca ou amarga na angústia de seu herói
desarmado, O Palhaço entrega
sucessivas pílulas de riso, revestidas de delicadeza, incertezas, fragilidades.
É um humor dosado, sem apelos baixos, de uma doçura comovente e sincera. Nesta
narrativa de descoberta e beleza, o ritmo patina no início, demorando-se mais
que o necessário nas cenas de circo, que melhor efeito teriam se reservadas com
maior volume apenas para o fim. Nada que desmereça a graça de O Palhaço.
É uma história que obtém sua grande verdade na epifania do
riso, algo de valor inestimável quando construído ou nascido das humanas
verdades, não das hipócritas manipulações do ridículo.
Se a tristeza parece ser o tema universal do cinema de
Selton Mello - como parecia prenunciado no densamente amargo Feliz Natal, seu primeiro filme - em O Palhaço ele a trabalha com esperança.
Sem plenas felicidades, mas com a revelação da vida e do humano no simples
gesto de rir e de fazer rir.
--
0 comentários:
Postar um comentário