quinta-feira, 3 de novembro de 2011

CRÍTICA - Desapego


DETACHMENT / TONY KAYE / EUA, 2011 / 100 min.
--
A melancolia que transborda no olhar de Adrien Brody em Desapego não traz em sua natureza qualquer amargura. É uma melancolia de aceitação, de penúria e conformação. Não há revolta em si, apenas uma grande tristeza e uma completa desesperança.

Parte deste desconsolo vem de sua vida pessoal, do um vazio que parece não saber preencher; a outra parte vem de seu trabalho como professor de escola pública. Brody interpreta o professor Henry Barthes, substituto que chega a uma escola pública para um curto período de aulas. Sem surpresa, o que ele encontra entre seus colegas é um reflexo de si mesmo; professores que vão da apatia ao total desinteresse passando pelo cinismo irremediável.

Na sala de aula, o reflexo que vê - também sem novidade para ele - é o do desolador sistema de ensino publico relegado aos desfavorecidos. Jovens que no mar de sua juventude sem perspectivas só encontra autoestima na rebeldia e afronta; algumas vezes nem nisso.

Fora do trabalho, Barthes catalisa em sua tristeza o passado traumático com o suicídio da mãe, enquanto cuida afetuosamente de seu avô materno, internado com Alzheimer. Em sua solidão, Barthes é investido de uma humanidade pungente. Ela está expressa no modo como passa a tratar uma jovem prostituta que conhece na rua. Uma relação na qual ele despeja o pouco de esperança que tem na vida, mas sem esperar grandes resultados.

Desapego não é um filme de redenção, embora esta utopia não esteja ausente de uma parte de sua estrutura final, num modo talvez até esquemático, mas mesmo assim de uma comoção esmagadora.

O filme é antes de tudo um recorte contundente da insanidade que pode assombrar uma escola pública de periferia nos EUA. Barthes funciona como um eixo de uma série de fragmentos desse cotidiano. A partir dele conhecemos personagens contaminados por esse sistema perverso e insolúvel. De um lado, os professores à margem da desesperança e do abandono, sofrendo pressões desmedidas. De outro lado os alunos, vítimas de si mesmos, condenados à marginalidade.

São marcantes as participações de nomes como Lucy Liu, James Caan, Marcia Gay Harden, Blythe Danner e Christina Hendricks como professores e dirigentes que estão no limite de sua capacidade de tolerância. Mas é de Adrien Brody o brilho de uma atuação tão tocante quanto a que ele alcançou em O Pianista.

Fragmentado de poesia, dor e desilusão, Desapego transborda de um sentimento reprimido, represado diante da impotência. Um sentimento que contamina a todos, que se revela perverso no escape que encontra quando o desabafo é inevitável. Um filme de uma beleza melancólica árdua, contrita na impossibilidade da esperança e na catarse de um mundo triste. Desoladoramente triste.
--

1 comentários:

  • Anônimo says:
    23 de março de 2012 às 19:32

    Muito bom, até agora o melhor filme que vi do gênero em 2012.

    Parabéns pela crítica!

Postar um comentário

Tecnologia do Blogger.