terça-feira, 8 de novembro de 2011

Do formato de seleção ao formato de exibição, os desafios da próxima Mostra


Encerrada a 35ª edição da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, seria hora de fazer um balanço da edição. Porém, diante das novidades e pesares deste ano, mais do que um balanço, é hora de olhar para seus novos desafios, que não são poucos.

A edição deste ano foi marcada pela morte de seu idealizador, Leon Cakoff, vítima de câncer. Cakoff criou a Mostra em 1977, no MASP, com 22 filmes na programação. Desde então, o evento cresceu a proporções gigantescas, passando a ter exibições em dezenas de salas e chegando a mais de 400 filmes selecionados; um gigantismo que passou a ser alvo de criticas.

A Mostra sempre foi “a Mostra do Cakoff”, que também era chamado de “Sr. Mostra”. Estes dois “títulos” exemplificam o caráter personalista que o evento tinha em razão do pulso firme de Leon em fazer o evento a seu modo e semelhança. Com sua morte, a pergunta que fica é qual será a “cara” da Mostra daqui em diante.

Parte da resposta está nas mãos de Renata de Almeida, viúva de Cakoff e seu braço direito na organização do evento desde 1989. É dela a responsabilidade de levar adiante o legado de Cakoff. Renata ainda não definiu como será esse futuro, mas acena com a possibilidade da criação de um conselho da Mostra, encarregado, entre outras coisas, da seleção dos filmes.

O certo é que a Mostra deve mudar nos próximos anos. Já nesta 35ª edição, algumas dessas mudanças foram colocadas a prova. A principal delas foi no critério para seleção de filmes. Pela primeira vez, o evento só admitiu em sua seleção de filmes internacionais obras inéditas no país. A consequência imediata foi uma queda no número de filmes: dos habituais cerca de 400 para cerca de 300.

A ideia partiu do próprio Cakoff, que mesmo com a saúde afetada pelo agravamento de sua doença acompanhou e palpitou na elaboração desta edição. A proposta de Cakoff pegou a equipe de surpresa e houve resistência. Mas prevaleceu, como sempre, a vontade do Sr. Mostra.

O resultado foi uma Mostra mais enxuta e com mais sessões de cada filme. Muita gente gostou. Por outro lado, esta mudança não deixou de criar polêmicas e ausências pesadas.

Uma das polêmicas envolveu o filme brasileiro As Hiper Mulheres, de Carlos Fausto, Leonardo Sette e Takumã Kuikuro, que foi cortado da programação na última hora. Pelos critérios de ineditismo para filmes nacionais, a obra não precisava ser inédita no Brasil, mas tinha que ser inédita em São Paulo. A organização da Mostra justificou a retirada do filme alegando que recebera a informação de que o filme já havia sido exibido na cidade.

Em nota publicada na página do filme no Facebook (clique aqui para ler), os diretores de As Hiper Mulheres lamentaram a exclusão de sua obra da Mostra. Alegaram que o filme segue inédito em São Paulo e que a exibição ao ar livre que ocorreu na Cinemateca Brasileira, em junho, foi de um corte provisório em DVD de trabalho. O corte final nunca teria sido exibido por aqui.

No campo das ausências, a mais sentida foi o novo filme do espanhol Pedro Almodóvar, A Pele que Habito. Frequentador assíduo da Mostra com seus filmes – e por vezes pessoalmente -, sua nova produção não pôde entrar na programação por ter sido exibida no Festival do Rio, semanas antes. Um fato que ilustra de certa forma a razão por trás do novo critério.

Por ocorrer perto do final do ano, a Mostra chega sempre depois que muitos festivais importantes no país já aconteceram. Em especial o Festival do Rio, que termina poucos dias antes da Mostra começar. Ao exibir filmes que já haviam sido exibidos e comentados pela imprensa anteriormente, o evento de São Paulo sofria um pequeno desprestígi, perdendo em destaque para seu principal oponente carioca.

Se de um lado o novo critério garante maior destaque para a Mostra, por outro priva o público de São Paulo de ver alguns filmes interessantes. Obras com poucas chances de chegar ao circuito comercial da cidade e que tinham na Mostra a única chance de passar por aqui.

Mas talvez o grande “calcanhar de Aquiles” da Mostra não esteja no formato da seleção, mas no formato digital de exibição. Foram as dezenas de problemas com as exibições digitais, que este ano geraram grande estresse no público. A gravidade e a recorrência de mudanças na programação e de atrasos e problemas técnicos nas sessões levaram a organização da Mostra e emitir uma nota de esclarecimento durante o evento.

Na nota (leia aqui na íntegra), a organização explica que tem preferência por receber de seus selecionados cópias em película, mas que não pode impor um formato de suporte a quem convida para participar. Como o mercado está em franca transição da película para o digital e como o custo da cópia digital é muito mais vantajoso, as produtoras convidadas para exibirem filmes na Mostra preferem enviar cópias digitais. O mesmo, segundo a nota, ocorre em festivais de renome internacional, como Cannes e Berlin.

No entanto, a nota deixa vago o motivo real de tantos problemas técnicos, dando a entender que parte do problema se deve ao atraso das salas na atualização tecnológica para exibição em formato digital.

De qualquer forma, o fato é que muitos problemas foram relatados pelo público e pela imprensa que cobriu o evento. Foi o caso de uma das projeções do aguardado Habemus Papam, que foi exibido sem legendas e com problemas nas cores. Entre os mais exaltados, as críticas foram duras. Entre os mais fleumáticos (ou amigos dos organizadores) o tom foi de condescendência. Já a solução definitiva, espera-se, fica para o ano que vem.

Agora é aguardar a 36ª edição e ver como será a cara da Mostra nos próximos anos. Os desafios estão postos á mesa, resta saber como serão desbastados.
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